19 de dezembro de 2014

Como se diz "carinho" em alemão?

Boa noite, Fábio! 

primeiramente gostaria de parabenizá-lo pelo excelente Blog. Descobri o seu blog por acaso logo no começo dos meus estudos e achei sensacional a sua didática. Desde então acompanho constantemente as suas atualizações.

Estou morando em Erlangen, no norte da Baviera, e dentro de alguns dias volto para o Brasil, porém uma dúvida me acompanha desde os primeiros dias de intercâmbio: qual seria a melhor palavra em alemão para o nosso tão conhecido termo "carinho" / "fazer carinho" ? Tentei tirar essa dúvida com alguns colegas alemães de diferentes regiões e todos eles citam no começo a palavra (die) Liebkosung , mas logo depois voltam atrás dizendo que talvez só a avó deles falaria isso. Por falta de um termo geral que envolva cafuné, massagem, afago, e qualquer outra ação que possa representar um gesto de carinho, meus colegas alemães passaram a usar a nossa palavra mesmo : " Carinho machen " . 

Mais uma vez, agradeço pelo excelente conteúdo disponibilizado e pelas fantásticas dicas dadas! 

Grande abraço! 
David Falcão Cavalcanti

Ótima pergunta, David. (Obrigado pelos elogios). Essa também foi uma dúvida minha por um tempo, mas acabei não indo mais atrás dessa resposta e aceitando que nem sempre os alemães se expressam da mesma forma. Naquela época cheguei à conclusão de que, mesmo que existisse uma palavra, essa palavra não era muito usada. 

Antes de qualquer coisa, eu geralmente não gosto quando as pessoas me pedem pra traduzir uma palavra assim fora de contexto, pois é um trabalho enorme de Lexicografia pesquisar todos os sentidos que a palavra pode ter. Mas vou fazer uma exceção, pois eu também acho a pergunta interessante.

Vamos aos dicionários: 
O Houaiss diz que "carinho" é "uma manifestação delicada, que pode ou não envolver contato físico, de apreço, amor ou meiguice". Essa definição pra mim é bastante importante, pois quando se diz "Tenho muito carinho por alguém" (não envolve contato físico) o sentido é um pouco diferente de "Fiz um carinho em alguém" (envolve contato físico). 

Significado 1: sentimento, sem envolver contato físico
O dicionário PONS traduz carinho, neste caso, por Zuneigung. Para se dizer então que se tem carinho por alguém: "zu jemandem Zuneigung haben/empfinden". 

Sie hat eine besondere Zuneigung zu Tieren. Ela tem um carinho especial por animais. (apesar de animais não serem pessoas, no caso, mas é só um exemplo)

Mas é claro que você pode dizer o mesmo usando verbos, sem necessariamente usar um substantivo. Por exemplo, jmdn. gern haben/mögen, no fundo transmite a mesma mensagem:

Sie hat/mag Tiere besonders gern.

Se por acaso você quiser dizer que tem "um carinho enorme" por alguém, eu sugiro usar verbos de "gostar" com advérbios de intensidade. Ich habe dich sehr gern

Ainda no mesmo sentido, eu também traduziria por Sympathie.

Prinz William genießt die Sympathie der Briten. O Príncipe William goza do carinho dos britânicos. (apesar de Sympathie também significar simpatia, essa simpatia é uma demonstração do sentimento  "carinho").

Significado 2: ato, envolvendo contato físico
Como seus amigos alemães disseram, não é muito comum ouvir a palavra Liebkosung em contextos informais, tal como nós usamos a palavra "carinho". É uma palavra de uso superformal e já está caindo em desuso (por isso, eles disseram que só as avós talvez falassem assim). 

Mais uma vez eu não tentaria recorrer a construções com um substantivo (tal como vocês dizem "carinho machen"), mas procuraria um verbo para dizer o tipo de carinho feito (já que alemão tem sempre verbos específicos para tudo). Pois bem, aqui vai uma pequena lista de verbos que, na minha opinião, são ações de quem "faz (um) carinho":

1) streicheln - quer dizer "acariciar". É o que você faz quando põe um gato no seu colo, você ficar deslizando a mão sobre os pêlos do gato, por exemplo. Isso é "streicheln". Se você fizer isso numa pessoa, é uma forma de fazer carinho, né? :-) Usa-se com complemento no acusativo.


2) schmusen - quer dizer "fazer carinho", trocar manifestações (com contato físico) de afeto e carinho (mas geralmente envolve beijos). Ou seja, quando duas pessoas estão ali abraçadinhas, dando beijinhos, se acariciando etc. Em outras palavras, para que aprender a palavra "carinho" se em alemão existe um verbo para isso? hahahaha (Também com acusativo: jmdn. schmusen ou miteinander schmusen)

kuscheln
3) knuddeln - Quando se refere a jovens e adultos quer dizer abraçar, ficar abraçadinho. O knuddelnschmusen podem ser sinônimos (com beijinhos e abraços). Mas o foco do knuddeln é o abraço. Knuddeln também se pode fazer com um bebê quando alguém o põe nos braços, o abraça, aperta e beija. 

É ou não é fazer carinhos? :-)

Também se usa com o acusativo:
Knuddel mich! - Abrace-me (carinhosamente)!

4) kuscheln - É o famoso verbo do inglês to cuddle. Pra quem não sabe é ficar agarradinho em busca de calor, carinho, aconchego, aconchegar-se a alguém. Diferente do schmusen, o kuscheln não dá a ideia de beijinhos, em geral, a pessoa está procurando um lugarzinho no colo, nos braços, junto ao corpo ou debaixo das cobertas onde esteja alguém. 

a) Usa-se o verbo de forma intransitiva (dá pra dizer com quem): 
Ich kuschle gerne. 
Ich kuschle gerne mit meiner Freundin. (Eu gosto de ficar abraçadinho com a minha namorada).

b) Ou usa-se de forma reflexiva sich an jmdn./etw. kuscheln
Ich kuschle mich an meine Freundin. (Eu me aconchego à minha namorada)

Esses quatro verbos da lista já dão uma ideia de que tipo de carinho se está fazendo. Nessas horas os alemães conseguem ser mais específicos.

Mas caso você não queira ser específico demais, dá pra usar o adjetivo zärtlich  + o verbo sein (ser carinhoso). 

Sie war sehr zärtlich zu mir. Ela foi muito carinhosa comigo. 
Caso não haja contato físico é mais comum dizer liebevoll em vez de zärtlich

De uma forma bem neutra, mas um pouco formal, dá pra dizer também Zärtlichkeiten austauschen (trocar carinhos, carícias), mas a forma zärtlich sein é mais usada. 

É isso! :-) Liebe Katharina, vielen Dank für die Tipps! 

16 de dezembro de 2014

Lichtgrenze é a palavra do ano 2014


Lichtgrenze
No dia 12 deste mês a Gesellschaft für deutsche Sprache (aprox. Sociedade para a língua alemã) publicou a lista de palavras do ano. Essa eleição já virou tradição e é bastante apreciada, pois a lista não é feita com as dez palavras mais recorrentes do ano e sim aquelas palavras que tiveram um significado mais importante naquele ano. Tem que ser palavras que tenham acompanhado o discurso político, econômico ou social do ano em questão. As palavras são escolhidas por um júri composto por membros da GfdS. Lembrando que o termo "palavra" pode também se referir a um termo composto por várias palavras, desde que este tenha sido usado representando um único conceito.

Vamos às dez palavras do ano:
1) Lichtgrenze: (fronteira de luz) - a palavra se refere às instalações comemorativas dos 25 anos da queda do Muro de Berlim. Foram instaladas por 15 quilômetros balões iluminados por onde passava o Muro de Berlim que separou a cidade por 28 anos. A palavra tem um sentido simbólico, pois a subida dos balões conseguiram representar bem a época de escuridão que foi viver numa cidade dividida. Ano que vem a Alemanha comemorará os 25 anos da reunificação.

2) schwarze Null: (zero preto) - a tradução literal fica estranha em português, pois em português usamos as cores azul e vermelha pra representar números positivos e negativos. A expressão schwarze Null foi usada durante o ano todo pelos partidos do governo federal indicando que a meta seria terminar o ano com as finanças no azul (não no vermelho). Ou seja, o zero preto representaria então um saldo que não é negativo.

3) Götzseidank: (graças a Götze) - é um jogo de palavras com a expressão Gott sei Dank (graças a Deus). Todo mundo deve se lembrar que na final entre a Alemanha e a Argentina na copa do Brasil de 2014, a Alemanha foi salva por um gol de Götze na prorrogação. Desde então, a expressão Götzseidank foi repetida várias vezes.

4) Russlandversteher: (entendedores da Rússia) - desde que a Rússia invadiu e anexou a Crimeia, houve muitos debates na Alemanha sobre o que anda acontecendo por lá. Como todo mundo conviveu (e ainda convive) com um medo de uma guerra acontecer tão perto da Alemanha, a mídia inteira (TV, jornais etc.) passou a convidar pessoas a analisar os acontecimentos. De um lado temos os "Russlandversteher", pessoas que tentam mostrar o lado da Rússia e defendem um diálogo com o país de Putin. E do outro lado, os que criticam a política neoimperalista russa.

5) bahnsinnig: (jogo de palavras entre Bahn [trem] e wahnsinnig [louco]). Este ano o sindicato de maquinistas da Alemanha promoveu duas grandes paralisações. O público, em geral, achou as paralisações exageradas, o que levou à criação da palavra. Eles estão loucos. Sie sind wahnsinnig, ou melhor, bahnsinnig.

P.S. Esse tipo de construção criativa é bastante comum também em português. Um exemplo é a palavra "petralha" (PT + metralha [que por sua vez vem dos Irmãos Metralha]). Se tivéssemos essas seleções no Brasil, palavras como "petralha" ou "mensalão" apareceriam com certeza na lista de palavras do ano. 

6) Willkommenskultur: (cultura de boas-vindas) - a palavra reacendeu o debate sobre a recepção de migrantes pedindo asilo político na Alemanha. Os debates ainda estão a todo vapor na mídia e agora nas ruas. Apesar disso muitas pessoas exigem uma Willkommenskultur dos alemães. É difícil definir exatamente o que é: solidariedade com os fugitivos de guerra que pedem asilo, recepção incondicional de todos os fugitivos, integração dos migrantes (?)...

7) Social Freezing: (congelamento social) - a palavra do inglês se refere ao congelamento de óvulos sem nenhum motivo medicinal. Depois que a Apple e o Facebook anunciaram suas intenções de oferecer essa possibilidade gratuitamente a seus funcionários que quiserem adiar a procriação para um período que não atrapalhe suas carreiras, o debate foi levado à mídia alemã.

8) Terror-Tourismus: (terror-turismo) - um jogo de palavras entre "terrorismo" e "turismo". A palavra trouxe à tona o debate sobre o alto número de jovens alemães que foram lutar na guerra da Síria. A palavra se refere ao medo que muitos alemães têm de ataques terroristas causados por jovens jihadistas alemães que foram lutar na Síria ao voltarem para a Alemanha.

9) Freistoßspray: (spray do tiro livre) - como todo mundo viu na Copa de 2014, os juízes marcavam o campo com um spray na hora de demarcar a posição da bola e da barreira de jogadores nos tiros livres. Este spray já era usado há tempos no Brasil. Com a Copa ele passou a ser usado na Alemanha também.

10) Generation Kopf unten: (geração da cabeça baixa) - este termo se refere à geração atual que parece estar sempre de cabeça baixa ocupada com seu smartphone, mais interessada na realidade virtual que nas interações com pessoas ao seu redor.

Ah, outra instituição escolhe todo ano a "Unwort des Jahres", ou seja, uma palavra que nem deveria ter sido criada por ser pejorativa, ofensiva, um termo errôneo, não adequado, mas a deste ano não foi divulgada ainda. A do ano passado foi Sozialtourismus que se refere a pessoas de países europeus mais pobres que estariam migrando para os países mais ricos apenas para usufruir de benefícios sociais. 

Gostou da lista? De qual palavra você gostou mais? Qual seria a Wort des Jahres de 2014 no Brasil? E em Portugal? E será que este ano teríamos também a Unwort des Jahres em português? Qual seria, na sua opinião?

15 de dezembro de 2014

Aprender alemão com professores não-nativos: prós e contras

Vejo muita gente falando "aprenda alemão com um nativo". Como sou professor de alemão, alemão não é minha língua nativa e tenho um blog de língua alemã, resolvi ser sincero e confrontar aqui as vantagens de se aprender um idioma com um falante nativo e com um alguém não-nativo.

Lembrem-se: eu não acredito que línguas se aprendam em cursos ou em aulas particulares. Línguas se aprendem no momento em que você sai do curso ou da aula particular para aplicar o que viu na aula. MAAAAS a aula é uma ferramenta no aprendizado. A aula pode ser um lugar para tirar dúvidas, (talvez a única chance ao vivo para) praticar a língua com outras pessoas, para se forçar a estudar (muita gente só estuda quando tem aquele compromisso com um curso/professor), para conhecer pessoas (tenho alunos que se tornaram um casal durante o curso de alemão), para aprender coisas que não estão nos livros (vale especialmente para os autodidatas) etc. Ou seja, as aulas são uma ferramenta para o aprendizado, mas o aprendizado EM SI, na minha opinião, ocorre fora de sala de aula. Dito isto, vamos para os comentários:

1) Nem todo falante nativo é professor(a)
Isso parece meio óbvio, mas não custa nada reforçar. Saber falar um idioma não quer dizer que a pessoa saiba dar aula de línguas. Ou será que todo falante de português é professor de português? Isso não impede que falantes sem experiência didática se ofereçam pra dar aulas (ou pra ajudar) as pessoas a aprenderem seu idioma nativo. Isso é normal. Quando a pessoa está se oferecendo para fazer um intercâmbio linguístico (conhecido aqui como Tandem), ou seja, ela te ajuda com alemão enquanto você a ajuda com português, tudo bem. Ninguém precisa ser professor pra oferecer ajuda, além disso, é geralmente de forma gratuita e ambos saem ganhando algo. Há também muito alemão que nunca deu aula na vida e começa a dar aula quando vai pro exterior. Bem, sobre isso, eu vou falar mais no ponto número 4. O importante é se lembrar de que, às vezes, um professor não-nativo formado conhece mais profundamente as regras da língua alemã do que um falante nativo que nunca estudou a fundo a sua língua. Então antes de menosprezar aquele que não tem alemão como língua nativa, analise o conjunto :-)

2) Você gosta do(a) professor(a)?
Em toda profissão há bons e maus profissionais. Isso vale também para os professores. Há professores que cativam seus alunos pelo jeito que ensinam e há outros que conseguem transformar qualquer assunto em tortura. Não adianta fazer aula com um falante nativo chato, com cara emburrada, com uma aula parada enquanto você adora a aula com seu/sua professor@ brasileir@ que sempre dá aquele show. O importante é GOSTAR d@ seu/sua professor@. Cada país tem suas tradições de aprendizagem e ensino. Na Alemanha o método de ensino é diferente. Os aprendizes alemães são bem mais independentes, mais autônomos. Com isso, aquele esforço enorme do professor de prender a atenção dos alunos nas aulas de línguas é um pouco desnecessário, pois os alemães que fazem cursos de língua na Alemanha quase sempre vão fazer os exercícios mesmo que a aula seja um porre. Então você pode dar o azar de fazer um curso de alemão na Alemanha que com alguém dá aula nesse estilo (bem no estilo Se vira!) e perder a motivação por achar a aula meio parada (diferenças culturais). Com isso, não estou dizendo que todo professor alemão faz uma aula parada. Com isso estou dizendo que se você gostar d@ seu/sua professor@, seja ele/ela nativ@ ou não, você vai aprender bem mais durante a aula do que com um@ professor@ de que você não gosta muito. Quero dizer também que o estilo de dar aula na Alemanha é bem diferente do do Brasil e isso talvez requeira uma certa adaptação. (Falo por experiência de quem já fez cursos de vários idiomas com professores alemães. O estilo de ensino é totalmente diferente.)

3) Falantes não-nativos têm uma pronúncia necessariamente ruim?
Um dos principais medos dos alunos é pegar uma pronúncia ruim de um@ professor@ que fala "com sotaque". Esse é um medo justificável. Infelizmente, assim como nem todo aprendiz é perfeccionista na pronúncia, nem tod@ professor@ não-nativ@ consegue soar como um falante nativo. Os alunos notam isso e criticam. E o pior: nos níveis iniciais é crucial ouvir e repetir os sons corretamente. Nesse ponto, os falantes nativos estão em vantagem.

Mas há uma exceção.
O português não tem ainda um dicionário oficial de pronúncia, ou seja, tanto o pernambucano que fala "bom Dia" quanto o carioca que fala "bom DJia" estão falando português corretamente. O alemão, diferentemente do português, tem uma pronúncia padrão, aceita como "correta" e ensinada nos livros didáticos. Essa pronúncia se assemelha bastante ao modo como se fala no Norte da Alemanha (já escrevi sobre Hochdeutsch aqui). Ou seja, se seu/sua professor@ vier do Sul da Alemanha, da Áustria, da Suíça é possível que a pronúncia dele/dela seja diferente daquela que você vai ouvir nos livros. Isso pode causar muita confusão. (E antes que digam: mas ele/ela é nativ@... Sim, mas os livros de alemão ensinam apenas a pronúncia padrão e é esta que se ensina nos cursos. Aqui no blog, todos os tópicos sobre pronúncia ensinam a pronúncia padrão, não-dialetal).
Além disso, há vários não-nativos que falam alemão sem sotaque. Quem disse que isso não é possível? Na faculdade fiz uma disciplina de Fonologia do Alemão com um professor não-nativo e foi excelente. Em todos estes anos na Alemanha já tive a felicidade de conhecer vários estrangeiros falando um alemão impecável. Além disso, a aula (como disse antes) deve ser apenas UMA ferramenta de aprendizado, mas não a única. O contato com os falantes nativos fora da aula pode tirar as dúvidas de pronúncia.

4) Seu/Sua professor@ tem experiência?
Esses dias li algo interessante: Quando um estudante se forma em Engenharia, ele é apenas um formado em Engenharia, ou seja, alguém que tem a formação necessária para exercer a profissão, mas para ocupar uma vaga de emprego, ele provavelmente necessitará ainda um período de treinamento naquilo que fará na empresa. Isso é normal. Professores de idiomas também vão aprimorando sua didática com o tempo. Eu comecei a dar aula de inglês com 16 anos. Naquela época eu me espelhava nos meus professores. Meu jeito de dar aula hoje está a anos-luz dessa época. Já são anos de experiência dando aula de alemão e português. Com o tempo, vamos acumulando materiais, as dúvidas dos alunos vão se repetindo e o professor ganha mais facilidade em ensinar. Na hora de escolher entre um nativo ou um não-nativo, verifique se você está trocando um não-nativo com 10 anos de experiência por um nativo sem experiência. E olha que aqui não estou falando de formação em Letras. Apesar de a minha formação em Letras ter sido bastante enriquecedora e eu perceber que muitos professores de línguas formados em outras áreas poderiam ainda ser melhores se tivessem uma base de teorias da Linguística e da Didática, a verdade (nua e crua) é que mesmo pessoas sem formação em Letras podem ser ótimos professores de língua. A mão na massa dá a experiência necessária. Uma formação teórica dá mais segurança para exercer a profissão.

P.S. Eu sou a favor da valorização do profissional formado em Letras. Mas afirmar que só formados em Letras são bons professores de idiomas vai contra a realidade que observo.

5) Qual é o seu nível no idioma?
Quanto mais alto o nível, na minha opinião, melhor @ professor@ nativ@. É que um falante nativo consegue expressar melhor as nuances da língua. Um nativo consegue usar mais expressões idiomáticas, conhece palavras muito específicas para dizer certas coisas, conhece uma série de ditados populares etc. Um estudante que quer chegar ao nível C2 de um idioma está interessado em se expressar de forma bem específica. Nos níveis iniciais, um professor que consiga (pelo menos) explicar as coisas em língua materna não é ruim. Não precisa dar a aula toda em português, mas dar uma ajudinha de vez em quando ou explicar a gramática na sua língua materna pode ser muito útil sim. Dito isto vem a pergunta: você quer dizer que um professor estrangeiro jamais será capaz de dar um curso do nível C1/C2? De forma alguma. Como falei antes, formação e experiência podem ser bastante determinantes. Bons professores não chegam para as aulas despreparados. Mesmo um professor não-nativo pode preparar uma aula maravilhosa de nível C1/C2. Se ele/ela for experiente, o aluno aprenderá tanto quanto com um nativo.
Dica: o Instituto Goethe oferece certificados de proficiência do nível C2. Se seu/sua professor@ não-nativ@ tiver um certificado do nível C2 e tiver experiência, não precisa ter medo, ele/ela será capaz de te ajudar a chegar ao nível mais alto de proficiência do idioma.

6) Existe alguma vantagem do professor não-nativo?
Sim, existe.
O professor que não tem alemão como língua nativa também teve que aprender alemão. Ou seja, ela passou por todos os processos de aprendizagem que um aluno vai passar. Ele teve que estudar as regras, memorizar vocabulário, manter contato com nativos etc. Ou seja, ele poderá dizer com bastante propriedade o que você deve fazer para aprender a língua. Ele saberá demonstrar mais empatia por suas dificuldades. É claro que sempre fica uma pulga atrás da orelha? Mas e se ele/ela também tiver internalizado erros durante esse aprendizado? E se ele/ela me ensinar algo errado? Se ele trocar um artigo durante a aula e eu aprender o artigo errado? É verdade... esse perigo é real, infelizmente.

Um falante nativo usa a língua de forma mais intuitiva, ou seja, as regras já estão internalizadas. Raramente um falante nativo de alemão vai errar um artigo ou cometer um erro grosseiro de declinação. Mas como falei, o que conta mais é a experiência no ensino. Alemães que já dão aula de alemão há muito tempo no Brasil já aprenderam quais as dificuldades comuns dos alunos brasileiros. Através da sua experiência e por ter alemão como língua nativa, ele está em maior vantagem em relação aos professores brasileiros que aprenderam alemão quando adultos. Além disso, o fato de ele/ela saber falar uma língua como nativo, não significa que esse conhecimento vai passar pra cabeça do aluno de forma automática. Para isso um@ professor@ precisa saber motivar, saber levar o aluno a aprender de forma autônoma, saber ouvir e tirar dúvidas etc. E essas características podem ser bem exercidas por qualquer bom/boa professor@.


Qual a garantia de que eu estou aprendendo alemão correto nesse blog?
Quando decidi fazer Letras no Brasil, já era um apaixonado por idiomas. Já dava aula de inglês (língua que tinha aprendido de forma autodidata e praticando com estrangeiros) em escolas da cidade, mas queria aprender outro idioma. Decidi então cursar uma Licenciatura em Letras com habilitação em português e alemão, um curso que (teoricamente) forma professores de português, alemão e suas respectivas literaturas. O curso não transforma uma pessoa em falante nativo de um idioma estrangeiro, mas te dá todas as ferramentas necessárias para você ser capaz de ensinar esse idioma para alguém depois de formado. A carga horária é bastante alta. Na UFC (onde estudei) o curso dura 5 anos. Em 5 anos, você faz oito cursos de 64 horas-aula cada de língua e cultura alemã bem como 4 cursos de literatura em língua alemã, além de disciplinas de fonologia, morfologia, sintaxe, produção de texto em língua alemã. Sem falar das disciplinas teóricas de ensino de língua alemã e do estágio supervisionado. Durante a faculdade ainda tive a sorte de conseguir uma bolsa de estudos para passar um ano na Universidade de Colônia cursando disciplinas e fazendo curso de alemão, tudo incluído no programa de intercâmbio universitário. Foi durante o intercâmbio que passei no DSH (é uma das provas de idioma aceitas para ingressar na faculdade na Alemanha). Depois disso, resolvi ainda fazer um mestrado na Alemanha em didática de língua estrangeira (mais especificamente no ensino de Alemão como Língua Estrangeira). Já moro na Alemanha há 7 anos e tenho contato com a a língua alemã desde 1999. Como toda esta formação, será que não estaria pronto pra dar aula de alemão? Pra muita gente não. Não tem problema. Se preferir ter aula com um nativo, tudo bem. Mas acho que me sinto preparado para ensinar alemão, sim. E muito bem, obrigado.

Eu tive excelentes professores de alemão do Brasil. Não deixaram em nada a desejar.

Moral da história:Aprender a língua de um nativo pode ser muito vantajoso, sim. Mas este nativo deve ter experiência no ensino (noções de didática, conhecimentos do métodos de ensino de alemão para estrangeiros), domínio da língua materna e ser uma pessoa agradável (ou seja, a aula desta pessoa te dá mais motivação para estudar). Se for um nativo com experiência de ensino, com certeza ele estará com mais vantagem do que os não-nativos. Caso seja um nativo sem experiência de ensino, prefira seus serviços para conversas mais informais (como num Tandem), mas não pague um valor alto pra alguém sem experiência apenas por ser nativo.
Um professor não-nativo tem que se esforçar duplamente para convencer o seu alunado de que é capaz. Isto se dá através da sua formação acadêmica, sua experência com o idioma, através de certificados de proficiência, de uma pronúncia clara etc. Caso você perceba que seu professor "se garante" no alemão, não tenha medo. O mais importante é que o aluno goste de ter aulas com aquele professor e faça progressos.

E você? Teve bons professores de alemão brasileiros/portugueses?

3 de dezembro de 2014

Escrever cartões de Natal em alemão

O que escrever num cartão de Natal em alemão? 

Todos os anos escrevemos mensagens desejando Feliz Natal para as pessoas. Algumas expressões estão fixas na nossa memória. Por exemplo: é normal desejar um "Feliz Natal e Próspero Ano Novo". Além de escrever coisas como "São os nossos votos...".

Em alemão, as expressões mais comuns usadas em mensagens escritas são:

Frohe Weihnachten! - Feliz Natal!
Frohes Neues Jahr! - Feliz Ano Novo! (tá, eu sei que não é de Natal, mas é tudo mais ou menos na mesma época)

Se você quiser ser um pouco mais longo:
Ich wünsche Dir sehr fröhliche Weihnachtstage und einen guten Rutsch ins neue Jahr.  - Desejo-te um Natal muito feliz e uma boa "entrada" no Ano Novo. - Para entender melhor a expressão "Guten Rutsch" clique aqui.

Em vez de desejar um FELIZ Natal, na Alemanha é comum desejar "besinnliche Weihnachtstage". Essa palavra besinnlich é um pouco complicada de traduzir, pois não a usamos nas nossas saudações natalinas em português. O adjetivo besinnlich (contemplativo, pensativo) vem de Besinnlichkeit (reflexão, contemplação). Quando os alemães desejam um Natal besinnlich, eles estão desejando que as pessoas possam passar um Natal de reflexão, ou seja, uma festa onde a família se encontre e possa refletir não só sobre o espírito natalino, mas sobre o ano que está acabando, sobre as relações familiares etc. É uma palavra bastante usada nessa época do Natal. Acredito que esteja relacionada ao que nós chamamos de "Espírito Natalino".

É costume também desejar muitas coisas para as pessoas. Neste caso basta usar a palavra viel (assim mesmo, sem declinar) acompanhada de um substantivo no singular.

Ich wünsche dir... (Eu te desejo...)
...
viel Glück - muita sorte, muita(s) felicidade(s)
viel Freude - muita alegria
viel Geld - muito dinheiro
viel Gesundheit - muita saúde

Caso o substantivo esteja no plural, usa-se viele:
Ich wünsche dir...
viele glückliche Augenblicke - muitos momentos felizes
viele Freunde - muitos amigos
viele Geschenke - muitos presentes

Se você quiser expressar seus desejos em orações completas, basta que você coloque uma vírgula, um dass e o verbo conjugado no final.

Ich wünsche Dir, dass im neuen Jahr all Deine Wünsche in Erfüllung gehen. - Desejo-te que todos os seus desejos sejam realizados no ano novo.
Ich hoffe, dass Dir der Weihnachtsmann viele Geschenke gibt. - Espero que o Papai Noel te traga muitos presentes.
Ich wünsche Dir, dass Du schöne Weihnachtstage im Kreis Deiner Familie verbringst. - Desejo-te que passes um belo Natal no seio familiar (em companhia da sua família).

Se você quiser desejar coisas como "Que a luz do Natal ilumine seus caminhos" ou "Que Deus te abençoe", começam-se as frases com "Möge" (singular) ou "Mögen" (plural).

Möge Gott Dich segnen - Que Deus te abençoe.
Möge das Licht von Weihnachten deine Wege bescheinen. - Que a luz do Natal ilumine seus caminhos.

Estas expressões foram úteis? Quais outras expressões natalinas você conhece?
Para ler mais sobre o Natal na Alemanha, clique aqui ou aqui.

27 de novembro de 2014

Fazer faculdade na Alemanha é de graça

Recentemente saiu a grande notícia. O último estado alemão que ainda cobrava taxas (Baixa-Saxônia) para estudar em suas universidades públicas aboliu a famosa Studiengebühr (taxa de estudo) que trouxe muitas controvérsias durantes os últimos anos. De fato, as universidades alemãs precisam de dinheiro e estavam (estão!!!!) tendo dificuldades para se manterem apenas com os recursos dados pelos governos e iniciativas privadas (não é só no Brasil o problema com os investimentos em educação). Alguns anos atrás muitos estados começaram a exigir que os alunos pagassem uma taxa de 500 Euros por semestre, que seria usada para suprir diversos gastos extras para melhoria da universidade (cada estado fez o seu próprio plano de como iria usar o dinheiro arrecadado). Houve muitos protestos, muitos estudantes preocupados em saber de onde tirar esses 500 Euros semestrais. Bem, as universidades da Baixa-Saxônia (a partir deste semestre) e da Baviera (desde o ano passado) foram as últimas a abolirem essa cobrança.

Mas será que estudar na Alemanha é totalmente gratuito?
Universidade de Colônia
Infelizmente não. Mesmo sem as taxas de 500 Euros, há outras taxas que os estudantes têm que desembolsar semestralmente. É o chamado Semesterbeitrag (contribuição semestral). Essa "contribuição" é obrigatória e serve para pagar custos com o DCE (que em alemão se chama AStA) e outros custos de administração. Em muitas universidades serve também para pagar o ticket semestral de transporte. Esse valor varia de universidade para universidade (pode ficar entre 75 Euros e 278 Euros, dependendo da universidade). Lembrando que esse valor é cobrado por semestre e não por mês. (A meu ver é uma taxa justa, especialmente a do Semesterticket que dá direito ao estudante usar praticamente todos os transportes públicos de uma determinada cidade ou região por 6 meses).
Além disso, alguns estados decidiram cobrar a Studiengebühr (a mesma que foi abolida!) de estudantes que demoram muita para se formar. Ou seja, se o tempo normal de estudo for 3 anos, já se passaram 6 anos e você ainda não se formou, em alguns estados é possível que você tenha que pagar taxas. É um recadinho: "Ei, querido(a), tudo bem que a universidade é pública, mas não exagere".

Ah, então isso é uma pegadinha, né? Achei que fosse totalmente gratuito!
Nada nessa vida é de graça, amiguinh@. Mas pense pelo lado positivo. Nos EUA, por exemplo, o ensino superior é caríssimo. Se você vier de outro país, mais ainda. Você teria que desembolsar uns $20.000 dólares por ano. Existem países na Europa (por exemplo, a Dinamarca) onde somente cidadãos da União Europeia podem estudar gratuitamente. Quem for de fora PAGA e paga caro. Se você olhar o preço das mensalidades de universidades particulares no Brasil, verá também que os 278 Euros por semestre não são nada. Então estudar na Alemanha pagando apenas uma taxa semestral (na qual também está incluído o seu ticket semestral de transporte) é praticamente de graça. 

O que fazer para estudar na Alemanha?
Depende de tantas e tantas coisas.
Antes de qualquer coisa, informe-se sobre os cursos e universidades existentes, bem como sobre os prazos. O ideal é consultar o site UniAssist. É um site com muitas informações (em alemão e inglês) sobre o processo de seleção para uma universidade.
Pessoalmente eu também gosto muito do sistema de busca da página do DAAD. Lá você pode procurar por várias opções: tipo de curso, área de estudo, tipo de universidade etc. Dá uma olhadinha aqui.

Depois de achar as informações sobre os prazos de inscrição e requisitos, mãos à obra pra juntar a papelada. As universidades aqui normalmente não pedem nenhum tipo de visto no processo de inscrição. O visto de estudante você só consegue depois de já ter sido aceito na universidade, pois é essa confirmação de vaga que vai te dar direito ao visto.

Eu só tenho o Ensino Médio completo. Dá pra fazer faculdade na Alemanha?
Normalmente o Ensino Médio não é suficiente, pois na Alemanha é exigido que os alunos tenham concluído o Abitur (que é uma espécie de Ensino Médio alemão preparatório para a universidade). Como a escola na Alemanha demora 1-2 anos a mais que no Brasil (dependendo do estado), é exigido que os estudantes estrangeiros com Ensino Médio façam um ano de escola preparatória (Studienkolleg) para a faculdade ou façam 4 semestres de faculdade no Brasil antes de tentar transferir pra uma universidade alemã. Geralmente eles analisam caso a caso.

Tem Vestibular?
Não. O processo de seleção é feito através de candidaturas, como você estivesse buscando um emprego. Cada curso lança seu calendário de seleção e publica a lista de documentos exigidos. Você envia a documentação exigida junto com a uma carta explicando seus motivos para se candidatar a essa vaga. Depois é só esperar uma resposta. Às vezes você pode ser convidado para uma entrevista antes de ser aceito pela universidade. Ou seja, as notas da escola e/ou da faculdade contam também na obtenção de uma vaga.

Precisa saber alemão?
O tanto de alemão necessário para estudar numa faculdade alemã vai depender de cada curso e de cada universidade. Não há uma resposta que valha para todos os casos. O ideal é você ler os requisitos no UniAssist ou no site de busca do DAAD. Para cada curso há uma lista de exigências. Alguns cursos exigem inglês e alemão. Há cursos completamente ministrados em inglês. Outros cursos podem ser completamente em alemão.

Os testes de proficiência geralmente aceitos para comprovar o alemão são o TestDaF, o DSH ou outros certificados de nível C1 ou C2. A nota exigida varia de acordo com cada curso. Cursos na área de Humanas, Direito etc. podem exigir melhores notas (já que requerem muita leitura). Cursos nas áreas técnicas podem aceitar estudantes com notas mais baixas nesses testes de alemão e exigir notas melhores de inglês. Para fazer Letras ou Tradução podem ser exigido comprovar outras línguas estrangeiras. Em alguns doutorados na área de Humanas podem ser exigidos conhecimentos de Latim. Como disse antes: quem define isso é a própria universidade. É só ler os requisitos.

Conseguir o visto de estudante é difícil para brasileiros?
Não. Diferente de outros países (como os EUA, por exemplo), onde mesmo depois de comprovar tudo o seu visto pode ainda ser negado, a Alemanha não costuma negar vistos de estudante caso toda a papelada exigida esteja adequada. As coisas principais são: um comprovante de que você poderá se manter durante os estudos sem trabalhar (isso pode ser comprovado através de uma declaração de bolsa de estudos ou através de dinheiro em conta no banco, por exemplo), seguro-saúde, comprovante de matrícula (ou de aceitação) na faculdade e comprovante de moradia. Outros documentos da lista podem variar, mas estes são os principais. A ideia é simples: se você tem como se manter, tem onde morar, tem um seguro de saúde e tem uma vaga na universidade, não há nenhum motivo para te impedir de estudar na Alemanha. O visto de estudante dá direito a 120 dias de trabalho por ano ou 240 dias se o trabalho for de meio-período. Durante o período de aulas, o estudante não deve trabalhar mais do que 20 horas por semana para não comprometer os estudos.

Se o seu problema for conseguir uma bolsa de estudos, fique atento ao blog. Nós sempre divulgamos editais de bolsa de estudo, seja pelo CsF como por outras organizações. Para saber sobre as bolsas de estudos que divulgamos, clique aqui.

Onde posso me informar mais?
O DAAD organiza muitas palestras no Brasil sobre o que fazer para estudar na Alemanha.
Haverá alguns eventos informativos nos próximos dias sobre doutorado (28,29 e 30 de novembro). (Informações: clique aqui)

25 de novembro de 2014

Palavras compostas curiosas da língua alemã

Alemão é uma língua cheia de peculiaridades na formação do seu vocabulário. Uma de suas características é poder juntar palavras para formar outras. Algumas junções são mais óbvias, outras menos.  Aqui vão alguns exemplos:

sapato para as mãos??!?!
1) Handschuhe = Luvas
Hand (mão) + Schuhe (sapatos) = ao pé da letra "sapatos para a mão".

2) Baumwolle = Algodão
Baum (árvore) + Wolle (lã) = ao pé da letra "lã da árvore"

3) Flugzeug = Avião
Flug (voo) + Zeug (coisa) = ao pé da letra "coisa que voa"

4) Feuerzeug = Isqueiro
Feuer (fogo) + Zeug (coisa) = ao pé da letra "coisa (que dá) fogo"

5) Schlüsselloch = buraco da fechadura
Schlüssel (chave) + Loch (buraco) = ao pé da letra "buraco para a chave". A fechadura se chama Schloss. Mas o buraco da fechadura, é chamado de buraco para a chave.

6) Schadenfreude 
Schaden (prejuízo, dano) + Freude (alegria) = é a alegria pela desgraça alheia. Parece uma palavra péssima, mas todo mundo já sentiu Schadenfreude alguma vez. Por exemplo, quando você ri do tombo de alguém, isso é Schadenfreude. Quando você fica feliz em ver uma pessoa de quem você não gosta (um político, por exemplo) se dando mal, isso é Schadenfreude.

7) Eifersucht = ciúme
Eifer (zelo) + Sucht (vício) = ao pé da letra, vício em zelo. O ciumento é o eifersüchtig. O legal é que em outras línguas o ciúme tem a ver com zelo. Em espanhol, ciumento é celoso. E em inglês é jealous (se você trocar o j por z, perceberá que a raiz é a mesma).

8) Kaltmiete / Warmmiete
kalt (frio) + Miete (aluguel) = ao pé da letra "aluguel frio". É o valor do aluguel, sem nenhum acréscimo dos custos extras de moradia.
warm (quente) + Miete (alguel) = ao pé da letra "aluguel quente". É o valor do aluguel acrescido do valor do condomínio (geralmente água e aquecimento).

9) Fahrstuhl = elevador
fahren (ir, conduzir, dirigir) + Stuhl (cadeira) = ao pé da letra "cadeira condutora", ou seja, um cadeira que te leva a algum lugar. Mas o elevador não é bem uma cadeira, né? Existem também outras palavras para elevador: Aufzug (que vem de aufziehen - içar) e Lift (que vem do inglês).

Curiosidade: a palavra bicicleta em alemão é feita com o mesmo radical "fahr(en) + Rad" - Fahrrad - a "roda condutora".

10) Feierabend = fim do expediente
feiern (festejar) + Abend (noite) = ao pé da letra, noite de festa, noite comemorativa. Muita gente erra ao traduzir a palavra como happy hour. A palavra Feierabend não quer dizer que a pessoa vá beber com amigos, nem precisa ser à noite. Mesmo que seu expediente termine às 14:00 e que você vá direto para casa, você também pode usar a palavra. Ela quer dizer realmente "fim do expediente". Nada impede que você saia com seus amigos para um Happy Hour depois do trabalho.

11) Augenblick = momento, instante
Auge (olho) + n (consoante de ligação) + Blick (vista, olhar) = ao pé da letra seria algo como "a vista ocular", ou simplesmente, o olhar ou a olhada, a olhadela. Isso me lembra muito a expressão portuguesa "num piscar de olhos", ou seja, algo que vai ser feito rapidamente, num instante, num momento. Quando em português se diz "Um momento, por favor", em alemão se diz "Einen Augenblick, bitte" o que sempre me fez lembrar do "piscar de olhos" do português. Um sinônimo é a palavra Moment.

12) Luftschlange = serpentina
Luft (ar) + Schlange (cobra) = ao pé da letra "cobra de ar".

13) Glühbirne = lâmpada
glühen (arder, estar em brasa) + Birne (pêra) = ao pé da letra, "pêra ardente", ou melhor "incandescente". São aquelas lâmpadas que tradicionalmente têm um formato de pêra.

E você se lembra de mais exemplos interessantes?

20 de novembro de 2014

Vida na Alemanha - Racismo na Alemanha

Para começar, aqui vão dois vídeos de um negro alemão onde ele relata perguntas idiotas que ele tem que ouvir:




Hoje é dia 20 de novembro. Dia da Consciência Negra. Um dia que tenta dar ao negro a consciência de sua negritude, a consciência do que a cor de pele representa atual e historicamente. Eu não sou negro. Não me identifico como negro, apesar de saber que, como brasileiro, deve haver muito sangue e muitos genes de origem africana em mim. Eu nasci com aquela cor de pele típica do brasileiro mestiço: nem tão branca, nem tão negra. Olhos e cabelos castanhos. O famoso "pardo" das estatísticas do IBGE. Eu tenho consciência de que não sou branco. E consciência de que não sou negro.

Por estar na parte do meio dos inúmeros tons de pele existentes, eu nunca passei pelas mesmas situações de racismo no Brasil que meus irmãos negros. Nem ganhei os privilégios de ter nascido branco numa família de classe média. Como nunca havia sofrido racismo, eu era mais um a não demonstrar nenhuma empatia pelo sofrimento do negro. Afinal, ninguém nunca havia me julgado pela minha cor de pele. Nunca.

Aí eu vim para a Alemanha. Sim, aquele país marcado eternamente por ter começado uma Guerra Mundial com uma política racista. O mais curioso é que a Alemanha foi destruída por um país que também tinha uma política racial segregacionista. Mas parece que ninguém vai pros EUA se perguntando sobre racismo. Mas todo mundo parece ter medo de encontrar alemães defendendo os ideais do seu ditador do passado.

A primeira vez que eu ganhei consciência de que a minha aparência chamava a atenção foi ao morar aqui. Foi na Alemanha a primeira vez que ouvi na vida: Você tem olhos bonitos! Essa frase, já ouvida várias vezes da boca de alemães, me deu consciência de que olhos castanhos podem ser bonitos. Numa terra em que boa parte da população tem olhos claros, ter olhos escuros é o diferencial. Eu tive a certeza de que jamais ouviria isso no Brasil, um país acostumado a idolatrar artistas brancos de olhos claros. Isso me deu consciência.

Numa outra ocasião ouvi de uma colega, alemã, branca "Nossa como eu queria ter a sua cor de pele". Respondi, atônito, "Sério? Por quê?". "Porque queria poder tomar sol, me bronzear, quando vou à praia fico vermelha, vocês se bronzeiam. É mais bonito". Essas e outras experiências me deram consciência de que em terras germânicas eu não passo despercebido como no Brasil. Aqui eu sou considerado "dunkelhäutig" (pele escura). E a minha pele chama a atenção.

Um dia aprendi que havia palavras tabu na Alemanha. Palavras que causam desconforto à maioria dos alemães. Todas elas são palavras que foram usadas e abusadas pela ditadura nazista. Uma delas é a palavra Rasse (raça). Hoje em dia a palavra Rasse só é usada quando se fala sobre o pedigree de animais, mas não mais sobre humanos. É claro que se pode dizer que uma pessoa é branca ou negra. O problema é chamar isso de "raça". Alemães não gostam desse termo. Também descobri que a palavra Neger, antigo termo para "negro" é considerado racista hoje em dia, preferindo-se o termo schwarz, ou até outros termos como Schwarzafrikaner, Schwarzafrikanerin, Afroamerikaner, Afroamerikanerin, Afrodeutscher, Afrodeutsche. O doce conhecido como Negerkuss (beijo do negro) passou a ser chamado de Schokokuss (beijo de chocolate). Imagine o que diriam os alemães se soubessem que no Brasil há um bolo de chocolate chamado "nega maluca".

Chances iguais?
Depois de fazer mestrado na Alemanha, acabei achando emprego numa universidade, ou seja, as pessoas com quem convivo diariamente são pessoas com um alto nível de educação. Meus alunos alemães se chocam um pouco quando sabem que o IBGE, um instituto nacional de estatística, ainda faz contagem de "raça" no Brasil. Ficam mais chocados quando aprendem os termos usados pelo IBGE "branco, pardo, negro, AMARELO(???), indígena". Mas não se enganem. Mais chocados ficam quando veem as estatísticas das diferenças de salário entre negros e brancos no Brasil. Mais chocados ficam quando vão ao Brasil e aprendem dos próprios brasileiros a se "protegerem" dos "negros" na rua, já que serão "ladrões" em potencial. Mais chocados ficam quando fazem um semestre de intercâmbio nas universidades públicas brasileiras e se perguntam: "Cadê os negros nesta universidade?". Sim, todos estes debates e comentários se repetem nas minhas aulas sobre o Brasil na universidade. Alguns vão pensar: Ah, vai dizer que na Alemanha não existe racismo? Mas minhas aulas não são sobre a Alemanha, e sim, sobre o Brasil. O importante, para mim, é levar os alunos a refletirem sobre as experiências que terão, que têm ou que tiveram no Brasil para que entendam melhor os processos históricos que levaram às diferenças raciais no Brasil.

Essa consciência eu não ganhei no Brasil. Eu ganhei aqui na Alemanha. Ganhei aqui pois aqui sou tratado diferente. Por ser tratado diferente, pude ganhar empatia pelas pessoas no Brasil que também são tratadas diferentemente. Já fui tratado de forma racista na Alemanha? Claro. Uma das formas mais comuns de racismo aqui é o racial profiling da polícia. Qualquer ladrão aqui é descrito como südländisch. E com südländisch eles já estão dizendo: deve ter vindo de algum país do Sul. E do Sul pode ser desde a Itália, da Grécia, da Turquia quanto de qualquer outro país onde faça mais sol do que aqui, que deixe a pele num tom mais escuro do que aqui. Sim, já fui parado pela polícia a caminho do trabalho apenas por ser südländisch. Sim, já fui a única pessoa do vagão inteiro de um trem a ter que mostrar documentos e abrir mala para a polícia enquanto as pessoas do vagão olhavam para mim (sem fazer nada). Dá raiva? Dá. Estraga o seu dia e o seu humor? Estraga. Mas passa. Sabe por quê? Porque eu talvez passe por isso 1-2 vezes por ano. Enquanto nos outros 363-364 dias do ano eu sou tratado como gente, sou tratado como o rapaz dos olhos bonitos, o brasileiro que com certeza anda sempre alegre, fazendo festa, sambando ou sei lá o quê. Mas esses dois dias por ano em que algo assim acontece me deram a vaga consciência do que um negro passa no Brasil ao ser revistado ao sair de um loja sem ter roubado nada. Ao ter o seu caráter julgado pela sua cor de pele. É por isso que, quando sei de algum brasileiro revoltadíssimo por ter sido barrado na porta de uma discoteca alemã, penso nos inúmeros casos de negros brasileiros que são barrados, revistados, expulsos de locais brasileiros (shopping centers, lojas, boates etc.) sem que ninguém se revolte. E eu espero que esse brasileiro barrado na entrada da discoteca ganhe essa consciência. Espero. Por isso, precisamos "brigar por justiça e por respeito", como diz Seu Jorge. Estamos juntos!

"A carne mais barata do mercado é a carne negra" - (Seu Jorge)

Leia os outros textos sobre Consciência Negra:
1) http://www.aprenderalemao.com/2014/11/negro-brasileiro-na-alemanha-haut-por.html
2) http://www.aprenderalemao.com/2014/11/negra-brasileira-na-alemanha-irmaos-de.html

Negra, brasileira, na Alemanha: Irmãos de cor na Alemanha por Cris Oliveira

Irmãos de cor na Alemanha
Cris Oliveira

Quando decidi vir pra Alemanha há mais ou menos 12 anos a coisa que mais me preocupava era como eu enfrentaria o racismo. Tinha certeza que quando chegasse aqui iria ter de passar por situações desagradáveis, só não sabia como elas se manifestariam e como me defenderia. Mas estava decidida a vir. Meu futuro marido estava aqui e me garantia que não precisava ter medo, que existia muito racismo aqui sim, mas que a gente se adapta, se fortalece, luta contra e aprende a viver com isso. No final das contas o amor falou mais alto e acabei vindo com medo e tudo.

Logo que cheguei, talvez por causa da minha expectativa anterior, me surpreendi. Andava meio na defensiva, com medo dos ataques que poderiam vir de qualquer lugar inesperado, mas com o passar do tempo fui percebendo que as situações desagradáveis para as quais eu me preparava tanto nunca vinham. Pelo contrário, comecei a notar que muitos dos alemães que eu encontrava por aí sabiam muito mais do Brasil, sem nunca terem ido lá, do que eu sabia da Alemanha apesar de já estar vivendo aqui. Percebi também que muitos tinham um interesse genuíno pelo Brasil, sua história e sua gente. Comecei a relaxar e perceber que os monstros que eu esperava encontrar aqui não andavam assim espalhados por toda parte e que essa terra estava passando por um processo de mudança impressionante, se tornando cada vez mais internacional, aberta e tolerante. 

Comecei a ver reconhecidas certas características minhas que no Brasil ou passavam despercebidas ou eram logo menosprezadas mesmo, como meus olhos escuros, a cor de minha pele e principalmente meu cabelo. Nunca fui chegada a chapinha ou alisamentos simplesmente porque me irritava ser dependente de qualquer coisa no meu dia a dia. Meus cabelos sempre foram mais pro natural por questão de praticidade mesmo, mas confesso que de vez em quando cedia a pressões da família (“menina, que cabelo doido, vai dar um jeito nisso”; era uma das coisas que eu ouvia das superbem intencionadas mulheres da minha família) e acabava dando um relaxamentozinho aqui outro ali. Aqui na Alemanha aprendi a gostar genuinamente de minha imagem no espelho, inclusive do meu cabelo “doido” e eu serei pra sempre agradecida a esse país por isso. 

Depois de ouvir incontáveis elogios a gente acaba se convencendo de que não há nada de errado com a gente e isso é maravilhoso. É um grande alívio quando percebemos que podemos escolher mudar alguma coisa em nossa aparência, mas não nos sentirmos forçados a mudar nada por uma mera questão de aceitação. Esse é o ponto: assim que cheguei a Bremen, eu como negra, me senti aceita e isso foi fundamental pra minha história aqui neste país.

Infelizmente a fase do namorinho apaixonado um dia chega ao fim em qualquer relação e a minha com a Alemanha não podia ser diferente. Passado o primeiro momento de encantamento, comecei a perceber que aqui as experiências de negriture variam muito e nem sempre as de outros negros com os quais eu convivi aqui foram assim tão positivas quanto as minhas. Prestando mais atenção e conhecendo mais pessoas, acabei notando que o racismo aqui se manifesta de forma muito complexa e em muitos momentos ele fica até difícil de identificar por ser confundido com outras coisas. Ou seja acaba parecendo muito com o que acontece no Brasil.

Hoje em dia, com o olhar mais crítico de quem já passou da fase de encantamento com o novo país, percebo que quanto mais escura a cor da pele maior o racismo enfrentado. A origem também é um fator importante. Todo mundo ama um negro latino, mas esse amor nem sempre se estende pros africanos. O preconceito aqui se manifesta, pelo menos pra mim, mulher brasileira, negra de pele não tão escura, de forma bem cordial. Eu entro em um lugar e as pessoas já esperam que eu seja a atração da festa. Todos acham que eu só vivo feliz. Que sei cantar, dançar, que sinto frio o tempo todo, que venho do morro, que sou supersensual e só penso naquilo. 

Na verdade, não me incomodo quando alguém tem essa imagem de mim. Essas só são primeiras impressões que podem ser descontruídas quando se conhece alguém melhor. O que incomoda mesmo é perceber que elas só têm uma imagem, e que essa imagem é tão reduzida e rígida que acaba me limitando também. É um saco ter sempre que conversar sobre essas mesmas coisas aí, simplesmente porque muita gente não entende que existe mulher negra brasileira que não sabe dançar, que não entende nada de futebol, que não acha o frio tão horrível assim e que não está o tempo todo tentando seduzir alguém.

Eu tenho a sorte de conviver com pessoas de mente mais aberta e reflexiva. Já passei por umas situações esquisitas, mas foram poucas. Enquanto isso tem gente que tem de lidar todos os dias com coisas muito piores como com o fato de sempre serem tratados como estrangeiros apesar de terem nascido aqui, com os olhares insistentes que ou desconfiam ou tem uma curiosidade invasiva e com as oportunidades de emprego mais escassas todos os dias. Esse é o racismo nu e cru dispensando qualquer cordialidade.

No meio de tudo isso a gente acaba reconhecendo nossos iguais. Pessoas, que como a gente sofre com as mesmas coisas e por isso entendem exatamente porque agimos como agimos. Por isso não é raro que caminhando pelas ruas de Bremen de vez em quando se encontre outros negros e negras que do nada se cumprimentam. Quando isso aconteceu comigo pela primeira vez, respondi a saudação, mas achei estranho. Sendo soteropolitana, se eu sair por aí saudando cada negro igual a mim que encontrar na rua, vou passar o dia inteiro só dizendo “oi”. Até que um dia uma negra, até meio parecida comigo, passou por mim e me cumprimentou de uma forma que me fez entender tudo. Ela sorriu e disse “Hi, sister”. O que pra ela foi somente um cumprimento, pra mim significou muito mais. Queria dizer estamos aqui nesse país cheio de pessoas diversas, mas existe algo em mim e em você que nos separa de muitos deles ao mesmo tempo que nos conecta com muitos outros de lugares que eu e você nem podemos imaginar. Eu vejo você e você me vê, mas pra ser visto muitas vezes é preciso passar por muita coisa e viajar pra muito longe. Desde então toda vez que encontro um outro preto ou preta por aí, não hesito em sorrir e dizer “oi irmão/oi irmã” e pensar comigo mesma “estamos aí. Estamos aqui”.

Leia os outros textos sobre Consciência Negra:
1) http://www.aprenderalemao.com/2014/11/negro-brasileiro-na-alemanha-haut-por.html
2) http://www.aprenderalemao.com/2014/11/vida-na-alemanha-racismo-na-alemanha.html

Negro, brasileiro, na Alemanha: Haut - por Maurício Virgens

HAUT

Essa semana como de praxe eu estava vendo o que meus amigos do facebook postavam... E me deparei com umas fotos de uma conhecida minha de lá da Bahia.... Bastante maquiada e "produzida" até o último fio de cabelo (alisado, por sinal!), eu notei porém que nos selfies a pele dela estava mais clara. Na verdade não era a primeira vez que eu havia notado isso. Na outra ocasião eu cheguei a comentar pessoalmente minhas observações, cheguei a dar uma dica pra ela de onde comprar uma base de acordo com nossa quantidade de melanina (maquiagem da mesma marca que eu uso quando estou trabalhando no palco). Masss... Ela se explicou... "Não... É que eu tenho uma doença de pele e daí eu uso uma base mais clara pra escondê-la..."

Doença de pele. Aham... 😒

Essa sensação de estar com uma doença de pele eu já tive algumas vezes na vida. Uma das primeiras e mais marcantes foi lá nos meus dezoito anos, quando um novo shopping pra classe alta estava sendo inaugurado em Salvador, o Shopping Barra. Eu e minha irmã nos candidatamos para trabalhar numa loja pra grã-finos chamada Chocolate. Alguns de vocês provavelmente não têm ideia do que significava a expressão "boa aparência" em um anúncio de jornal naquela época, mas... Como nós dois éramos conscientes de nossas belezas afrobrasileiras (tínhamos aqueles penteados de Grace Jones, roupas tipo negões de Nova Iorque... éramos até manequins... Era moda naquela época, não riam!)... Então fomos lá apresentar nossos currículos que também não deixavam nada a desejar para recém-graduados de escola particular.

Passamos pela seleção curricular, fizemos uma bateria de testes de matemática, de português, de contabilidade básica, físicos, psicológicos... Até que na última fase, a funcionária da empresa, não tendo mais nenhum argumento que pudesse embasar alguma falta de qualificação nossa pra ser vendedor de loja, nos disse finalmente que não nós tínhamos o perfil da empresa. Perguntamos que perfil era aquele... Ela olhou pra a nossa pele. Doentes de pele não satisfazem perfil de loja de grã-fino. Danke für den Hinweis!! 😳

Passaram-se alguns anos. Eu já estava cursando arquitetura na UFBA. E ocorreu de minha turma viajar para São Paulo, creio que para um congresso de arquitetura. Comprei minha passagem de avião parcelada em juros a perder de vista... Chegamos todos no aeroporto um pouco em cima da hora para pegar o vôo, que por estar lotado, fomos alocados na primeira classe (até hoje eu não entendi o porquê daquele upgrade gratuito...). Estávamos então todos eufóricos, nos sentindo ricos e famosos... Até quando a aeromoça, ou melhor (como se diz na primeira classe) a Stewardess começou a fazer a contagem dos passageiros, e ao me ver sentado ali naquela poltrona de couro, parou e fez uma expressão de? 😒... Isso mesmo! De quem está vendo alguém com uma doença de pele. 

Dito e feito. Ao fazer o serviço de bordo, me serviu por último(!!) e para arrematar o tratamento VIP, me deu um prato com comida estragada. Chamei-a: "Com licença, a comida está estragada, me traga uma outra, por favor!"... "É a última que temos, senhor!" - com um sorriso sarcástico... "Então pode levar de volta, obrigado!", respondi me sentindo o cocô do cavalo do bandido preto que nem apareceu no filme de cowboys caucasianos.

Se não são sadios de pele, que comam comida estragada! Parafraseando a frase atribuída erroneamente(!!) a Marie Antoinette "S'ils n'ont plus de pain, qu'ils mangent de la brioche!"


Eis que anos depois, tive aqui na Alemanha um déjà-vu.

Eu tinha um compromisso profissional em uma cidade a quase 4 horas de distância de Colônia, onde moro, e pra isso acordei bastante cedo. Só que por azar (ou por ansiedade) me levantei com aquela dorzinha de cabeça querendo começar... Botei então meus óculos escuros e passei numa farmácia antes de pegar meu transporte. Entrei na loja e me dirigi direto ao balcão quando percebi que uma das atendentes já me media dos pés à cabeça... Com aquele certo olhar de quem está vendo um? 😒... Isso mesmo!! Um doente de pele!

Pensei: "Curioso! É raro eu receber este tipo de olhar assim tão explícito aqui na Alemanha... Ela não se deu conta que eu apesar dos óculos escuros a estou vendo... Hmmm... É nela que eu vou comprar minha aspirina!". Dito e feito. Foi intrigante ver suas expressões faciais irem se mudando ao tempo em que me atendia e percebia meu nível de alemão, minhas "boas maneiras", minha carteira que (por coincidência ao contrário de outros dias!!!) estava relativamente gorda... Eu me senti como naqueles filmes de temática religiosa nos quais as feridas dos leprosos vão desaparecendo pelo toque de algum santo... Senti que minha pele se curou em dois minutinhos de atendimento.

Doença de pele se cura com domínio do alemão e boas maneiras? Será que foi isso? 

Pra lhes dizer a verdade, nesta altura de minha vida... Mir ist wurst! Pra mim tanto faz como tanto fez a resposta a essa pergunta... Eu me amo como eu sou. Eu amo ser preto. Amo minha pretitude, amo minha negritude, amo minha baianidade nagô. Me sinto muitíssimo confortável em minha própria pele... meu olhar sobre minha ancestralidade e minha cultura afrodescendente são extremamente saudáveis.

Sim, Mauricio... Mas dá pra ir ao ponto da questão, bitte? Danke!

Ok, Leute... Seguinte. Estou passando mais uma semana da consciência negra em terras alemãs... Minhas reflexões sobre ser afroconsciência porém não são coisas de uma semana... Elas fazem parte de meu dia a dia. Ao contrário de minha juventude, quando volta e meia eu ouvia "mas você não é preto/negro... Você é moreno!", aqui na Alemanha não tem meias palavras quando se trata de identificação étnica. Eu adoro ser enxergado, visto, tratado como afrodescendente, como preto. Sem maquiagens, sem mesticismos, sem teorias sobre "boa aparência" e sobretudo, sem morganfreemismos. (Sim, estou falando daquele excelente ator African American que propõe que se deixe de celebrar a consciência negra, que se esqueça que existem negros e brancos como solução para o racismo no mundo. Pra vocês verem que como cientista social ele é um excelente padeiro).

Na última vez que estive em Salvador eu passei novamente no Shopping Barra, e em outros shoppings com lojas pra grã-finos... A tal butique Chocolate já não existe há anos... Deve ter falido... Ou a dona muito provavelmente se mudou pra Miami. Mir ist wurst... O que vocês não imaginam é como me foi prazeroso ver funcionários pretos e pretas lindíssimos trabalhando nas lojas. Pretitude linda e afrocentrada. Eu sei que ainda é pouco. Mas não posso deixar de comparar com o nada de quando eu tinha dezoito anos, onde havia o estúpido consenso da doença de nos considerar doentes de pele.

Mas então vamos salvar o resto do mundo, vamos sair às ruas, levantar bandeiras, vamos desinfetar o outros desta doença de "ver doença na pele não-branca".... We are the world.... We are the children, we are the ones who make a brighter day sOHWAIT!!!!! Es tut mir Leid, mas não tem como salvar os pacientes terminais! Existem doentes sociais que estão em estado crônico sem possibilidade alguma de cura. Ainda mais sendo o racismo uma doença social com "predisposição genética".... 

Como é que é?

Desenhando: há séculos atrás, existia uma família branca e feliz que via a "pele escura" como defeito/sujeira/imperfeição/negatividade. Aí eles se amaram e procriaram... E seus filhos aprenderam pelas historinhas de seus pais e avós os mesmos conceitos sobre "pele escura". E eles se amaram e eles também procriaram... Um dia, o rei e a rainha perceberam que ao tempo em que se multiplicavam viam que manter esses conceitos sobre "pele escura" garantia o seu poder em todo o reino. Então eles declararam "pele escura" como uma doença fatal! Mas como a rainha era muito esperta ela disse: "não podemos abrir o jogo, senão esses "peles-escuras" vão se insurgir e nos tirar do poder... Vamos fazer de conta que tá tudo bem?" E todos os seus súditos regozijaram com a inteligência de seus soberanos... E desde então tentam viver felizes para sempre.

Eu acredito porém, que a realidade fora dos contos de fadas apresenta um futuro desanimador para o "rei e a rainha". É somente questão de tempo até os "genes" virarem recessivos de geração em geração até que em algum futuro próximo nasçam pessoas sãs e salvas... Até lá, todos os pacientes terminais já aussterben (dá uma googlada pra ver o significado 😉)

Mas vamos ser otimistas. Talvez para alguns valha realmente a pena um tratamento de choque. Eu, por exemplo, já salvei três vidas nestes meus 20 anos de internet. Mesmo convivendo involuntariamente com um ou dois "casos perdidos", uma estatística pra mim animadora, pois os "curados" têm potencial multiplicador de saúde social. 

"É, mas você não vive a realidade brasileira, você blá blá blá mimimimi whiskas..."

Talvez você tenha razão. A distância da realidade brasileira tentou anos a fio "qualificar" minha pele como doença, e por caridade judaico-cristã a chamavam de "pele morena"...

"Ohhh... Você não é doente não, só está com uma gripezinha...!" 😱

... talvez o afastamento deste ar pseudo-europeu que vocês na terrinha brasilis respiram tenha me curado.

A estrutura alemã me dá a única possibilidade de ser quem eu sou. E como eu amo ser preto... Logo minha vida aqui, em comparação com a no Brasil, está sendo sopinha no mel. 

Uma curiosidade pra concluir... Escrevi este texto um dia inteiro, e entre um ou outro parágrafo eu tive que ir dar uma aula de canto...  No caminho de volta pra casa, entrei no metrô, e notei que havia fiscais... (Diferente do Brasil, aqui não existem catracas. As máquinas que emitem tickets estão à disposição para o passageiro honesto comprar seus bilhetes. Acontece porém de vez ou outra aparecer um funcionário à paisana (ou não) para fazer a fiscalização. Como já disse uma vez numa outra crônica, a expressão alemã para "viajar sem bilhete" é "schwarz fahren".)

... Eis que hoje havia um funcionário da companhia de transportes com a pele "negra como a noite" controlando a validade dos bilhetes dos passageiros. De súbito pensei... 

"Wie geil ist das denn! Ein schwarz-wie-die-Nacht-Kontrolleur auf der Suche nach Schwarzfahrern! (Que irado!!! Um fiscal preto como a noite à procura de passageiros viajando no preto!)

... O rapaz era belo, parecia um príncipe africano. Ele chegou pra mim, me olhou e sorriu. Um olhar de saudável para saudável. Em um átimo de segundo nos identificamos por nossas peles sem doenças e nos vimos socialmente com saúde pra dar e vender. Sorri de volta, mostrei meu bilhete e continuei a observá-lo andando calma e elegantemente pelo corredor do metrô... Um príncipe, sem dúvida!

Cheguei em casa com uma sensação maravilhosa de pertencer a uma irmandade preta. Só nós, pretos e pretas com saúde, podemos saber o que significa encontrar um/a outro/a preto/a que nunca vimos e nos sentir num ilê. Estejamos em qual país for... Nos conecta a certeza de que nossas histórias pessoais não são diferentes. A consciência de que somos sadios de pele é o que nos une.

Doença de pele... Aham... Nenhum olhar doente racista vai conseguir tirar a saúde de nossas peles!

Eu já chamei o SAMU pra irmã que usa maquiagem em tom mais claro por pensar estar com doença de pele... Acredito que ela estará se convalescendo em breve... Mas é pra nós, afrocentrados, irmãos e irmãs de peles sadias e ululantemente pretas, sem maquiagens, sem mentiras históricas, óbvias nas realezas de nossas ancestralidades africanas que eu dedico essa crônica de 20 de novembro. 


14 de novembro de 2014

Como melhorar o alemão através de leitura

1) Verifique o nível do texto
Antes de entrar em depressão por não entender nada e achar que o problema é você, pode ser que o texto esteja muito difícil para o seu nível de alemão. Como se sabe isso?
Estudiosos dizem que um texto está no nível correto de dificuldade se ele estiver no nível x + 1. O que seria esse x + 1?
Bem "x = tudo o que você entende ou sabe num idioma" e esse "1" quer dizer que ele deve ser um pouquinho mais difícil do que isso.
Tem gente que só fica feliz ao entender um texto completamente, palavra por palavra, sem usar o dicionário. Mas pra falar a verdade, se você entender realmente TUDO de um texto, o texto é FÁCIL demais para você. Se você quer aprender através da leitura, o texto tem que ter algumas palavras novas, tem que ter alguma coisa que você só conseguiu entender através do contexto, tem que ter alguma coisa a aprender. Ou seja, não adianta estar no B1, pegar textos do nível A1 e sair por aí gritando "Uhuuuuuu, entendi tudo". Então lembre-se: um texto está no seu nível quando ele for x + 1.. ou seja, você tem que entender quase tudo de forma que você não precise parar muito pra olhar no dicionário, mas também pode ter algumas palavras desconhecidas.

Vejamos o exemplo abaixo:
Eu postei esse texto no Facebook recentemente. Vários leitores disseram que entenderam quase tudo, faltaram só algumas palavras (provavelmente "bestaunen", "flauschig" e "schnappen"). Bem, se você entendeu todo o resto, esse texto está no seu nível e as palavars que faltam você pode procurar no dicionário depois. Se você entendeu só metade do texto, ele ainda está acima do seu nível. Se você entendeu TUDO, o texto está fácil demais e você precisaria de outros textos para aprimorar o seu alemão.

A pergunta que não quer calar: Como achar textos só do seu nível?
1) Nos livros didáticos: se você souber qual o seu nível (A1, A2, B1 etc.) tenter ler os textos do próprio livro. Caso você já tenha lido todos os textos do seu livro, procure outros livros didáticos (numa biblioteca, por exemplo) apenas para ler outros textos. Se os textos do seu livro didático são muito difíceis para você só há duas explicações possíveis:
a) Os autores do texto realmente não seguiram a lógica do x+1 e colocaram textos acima do seu nível.
b) Você está frequentando um curso acima do seu nível verdadeiro. Talvez seja necessário voltar um nível para ficar no nível certo de leitura. Ou então você está no nível certo do curso, mas não tem se esforçado para aprender palavras novas e se confia sempre no dicionário.
2) Livros paradidáticos: Há livros com leituras fáceis. Tente comprar algum. Já dei dicas de leituras facilitadas aqui.
3) Notícias facilitadas: Para ler notícias com linguagem facilitada, indico o site http://www.nachrichtenleicht.de/. Procure notícias sobre as quais você já tenha uma ideia antes de ler, assim você poderá entender mais pelo contexto. Mesmo assim, se for muito difícil (um texto é difícil demais se você precisar consultar demais o dicionário), continue estudando alemão e espere aumentar mais o seu vocabulário. Procure textos mais fáceis.

2) Compre livros bilíngues
Essa dica vale especialmente para alunos mais avançados no idioma (mas também para quem já terminou o B1, pelo menos). Há algumas editoras que lançam livros bilíngues, inclusive em português-alemão. Os livros bilíngues (por exemplo: português/alemão) trazem o texto em alemão numa página e em português na outra. Assim você pode ler nas duas línguas simultaneamente.
Se seu interesse for aprender/melhorar alemão, sugiro que leia primeiro o texto em alemão e só depois confira a tradução em português para ver se entendeu tudo.
Caso não encontre um livro bilíngue, você poderá também comprar dois livros, um em alemão e um em português e lê-los paralelamente.


Mas atenção:
- As traduções de obras literárias nunca são feitas literalmente. Ou seja, não espere encontrar cada palavra tal e qual na tradução. O tradutor tem a liberdade de mudar um pouco a ordem dos termos para que faça mais sentido na outra língua. Mesmo assim, as traduções de textos literários costumam ser bem próximas ao texto original.

Quer dicas de livros bilíngues alemão-português? Aqui vão algumas: esse, esse, esseesse ou esse, por exemplo.

3) Não pare a leitura a cada palavra desconhecida
Se você for desses que se desespera a cada palavra desconhecida, tenho uma coisa a pedir: PARE! Pare com isso já. Se até na nossa língua materna existem palavras que desconhecemos, por que você acha que tem que entender TODAS as palavras? A leitura detalhada, ou seja, aquela que requer o entendimento de 100% do texto, só é apropriada em situações nas quais for extremamente importante entender tudo: por exemplo, se o texto que você estiver lendo for para a prova da faculdade ou se você estiver lendo uma bula de remédio buscando uma informação sobre a sua posologia.
Na maioria dos outros casos, dá sempre para ignorar certas palavras sem perder o sentido do texto.

Por exemplo:
Das grüne Haus, das wir gestern gesehen haben, ist außerordentlich schön. 

Se você parou na palavra außerordentlich, mas entendeu todo o resto da frase, você, de fato, ENTENDEU a frase. Em vez de parar a leitura, eu sugiro que você marque essa palavra (sublinhando, por exemplo) e continue lendo o texto. Deixe para verificar essas palavras só depois de terminar a leitura. Assim, a leitura continua sendo agradável e você aprenderá novas palavras depois, caso se interesse em aprendê-las.

4) Leia as frases/os parágrafos sempre até o fim
Para entender um texto, é necessário sempre analisar o conjunto da obra, não só cada palavra. Mais uma vez: não se desespere ao não entender uma palavra. Continue lendo o texto para ver se você conseguirá mais tarde inferir o significado através do contexto.

Outra coisa importante: alemão é uma língua que deixa partes importantes da oração (como verbos e prefixos verbais) para o fim da oração. Parar uma frase no meio pode ser fatal, pois a informação mais importante pode estar justamente no fim.

Das kommt nicht auf seine Entscheidung...
Se você ficar traduzindo o começo da frase acima mentalmente como "Isso não vem ao seu..." e parar a frase no momento em que aparecer uma palavra desconhecida (Entscheidung, por exemplo) e esquecer de ler o resto da frase (Das kommt nicht auf seine Entscheidung an.), a frase poderá não fazer sentido... no caso, ankommen significa "depender".

Mesmo em frases curtas, o entendimento da frase pode ser prejudicado, caso você não identifique os prefixos verbais:

Er hat vor zu schlafen. Muita gente vai ficar confusa, tentando entender essa frase. Uns vão achar que quer dizer "Ele tem que dormir" outros vão pensar que é alguma coisa "antes de dormir", mas na verdade se trata do verbo separável vorhaben, que quer dizer "pretender" - Ele pretende dormir. (Antes que me perguntem: sim, é normal terminar a frase já antes do infinitivo com zu)

5) Estude o Präteritum
Em textos literários, jornalísticos e científicos, é normal o uso do Präteritum. Mesmo que seja usado pouco na linguagem falada, é importante conhecer ou, pelo menos, reconhecer suas formas.

Quando o Pequeno Príncipe encontra a raposa, por exemplo, vemos vários exemplos do Präteritum:
In diesem Augenblick erschien der Fuchs.
"Guten Tag", sagte der Fuchs.
"Guten Tag", antwortete höflich der kleine Prinz, der sich umdrehte, aber nichts sah.
(...) "Komm und spiel mit mir", schlug ihm der kleine Prinz vor

É importante reconhecer que "schlug...vor" vem de "vorschlagen" e que "sah" vem de "sehen". Mesmo que depois você não saiba usar essas formas, é bom treinar para reconhecê-las nos textos.

6) Aprenda palavras novas através da interpretação das partes
Existem muitas palavras que podem parecer "novas" a princípio, mas que são fáceis de serem compreendidas caso você entenda as partes que a formam. Isso se aplica especialmente a palavras compostas, mas também a outras palavras.

Sie haben sich tagelang darüber unterhalten.

Digamos que você esteja vendo a palavra tagelang pela primeira vez. Que tal dar uma olhadinha nas partes dela? Provavelmente você conhece a palavra Tag (dia) e sabe que seu plural é Tage (dias). A palavra lang também você conhecerá provavelmente como o adjetivo longo. Bem, mesmo sem olhar no dicionário você poderia chegar à interpretação dessa palavra como "ao longo dos dias". A palavra quer dizer "dias a fio, por vários dias". Existem também variantes como "wochenlang" e  "jahrelang". Eu sei que nem todo mundo consegue fazer esse tipo de interpretação, mas antes de olhar num dicionário, veja se você mesmo(a) não consegue interpretar a palavra.

Essa capacidade de inferir significados não cai do céu. É necessário ter um bom repertório de raízes germânicas bem como de prefixos e sufixos. Por exemplo: Das kann ich mühelos verstehen. 
Digamos que você nunca tenha ouvido a palavra mühelos, mas já tenha conheça a palavra Mühe (esforço), fica mais fácil entender a palavra quando se sabe que o sufixo -los quer dizer (sem, ausente de). Ou seja, mühelos = sem esforço. Se você vir a palavra "Bemühungen" e souber o sentido dos prefixos e sufixos, não será dificíl perceber o significado.

P.S. Eu sei que nem todo significado das palavras se obtém através da intepretação das partes, mas na maioria dos casos, sim, portanto, a dica continua sendo útil.

Para leitores avançados:
7) Traduza textos da sua área de estudo ou de interesse
Existem muitos e muitos textos em alemão sem tradução para o português. E você pode aprender alemão traduzindo-os. Esse tipo de aprendizado através da tradução não é muito indicado para quem tem conhecimento zero do idioma. Mesmo quando a pessoa já tem um bom nível no idioma, pode ser bastante chato e desafiador traduzir textos complicados. Conheço várias pessoas que aprendem alemão para ler obras clássicas de filosofia, política, psicanálise,  etc. no original.

Um texto de Freud. Quer tentar?

DAS TRAUMMATERIAL – DAS GEDÄCHTNIS IM TRAUM
Daß alles Material, das den Trauminhalt zusammensetzt, auf irgendeine Weise vom Erlebten abstammt, also im Traum reproduziert, erinnert wird, dies wenigstens darf uns als unbestrittene Erkenntnis gelten. Doch wäre es ein Irrtum anzunehmen, daß ein solcher Zusammenhang des Trauminhaltes mit dem Wachleben sich mühelos als augenfälliges Ergebnis der angestellten Vergleichung ergeben muß. Derselbe muß vielmehr aufmerksam gesucht werden und weiß sich in einer ganzen Reihe von Fällen für lange Zeit zu verbergen. Der Grund hiefür liegt in einer Anzahl von Eigentümlichkeiten, welche die Erinnerungsfähigkeit im Traume zeigt und die, obwohl allgemein bemerkt, sich doch bisher jeder Erklärung entzogen haben. Es wird der Mühe lohnen, diese Charaktere eingehend zu würdigen.

Então muita hora nessa calma! Antes de se desesperar, faça as seguintes perguntas:
1) Você já tentou ler um texto do Freud antes em português? A leitura foi fácil? Se foi difícil, ela também será difícil no original.
2) Você tem uma boa noção dos fenômenos gramaticais e estruturais da língua alemã? Ou seja, você consegue reconhecer como uma oração é formada, qual palavra vem primeiro, qual palavra aparece no fim e como as palavras se ligam umas às outras? Se sua resposta for NAO, pode ser bastante complicado entender um texto mais complexo.
3) Você está familiarizado com o linguajar dessa área de estudo? Ou seja, você já leu outros textos em língua materna sobre o mesmo tema? (Não adianta querer ler textos de Marx sem nunca ter lido nada sobre o Comunismo, né?)
4) Não se preocupe: as pessoas não costumam falar alemão assim. A linguagem científica costuma ser complicada mesmo em qualquer idioma.

Antes de sair traduzindo textos, veja se você está familiarizado com esse tipo de texto no seu próprio idioma. Um advogado terá menos dificuldade em traduzir um texto jurídico do alemão pro português do que um leigo. Portanto, caso você queira aumentar seu vocabulário na sua área de estudo, você pode traduzir textos (mesmo aqueles para os quais já exite uma tradução) como exercício. Nesse caso, a leitura do texto vai ser mais lenta do que a leitura por diversão. Dependendo da complexidade do texto, você pode precisar de dias para traduzir um capítulo do livro que queira ler, mas esse processo de traduzir pode te dar mais segurança para ler outros textos mais tarde. Faça isso como exercício.

Veja que as frases de textos científicos são mais longas (o primeiro período do texto tem mais de duas linhas). É importante perceber onde uma oração começa e a outra termina. Além disso é importantíssimo procurar palavras (conjunções, pronomes etc.) que se referiam a outros termos do período. Então vá analisando as frases com calma:

Daß alles Material, das den Trauminhalt zusammensetzt, auf irgendeine Weise vom Erlebten abstammt, also im Traum reproduziert, erinnert wird, dies wenigstens darf uns als unbestrittene Erkenntnis gelten.

No período acima, o pronome dies (isto) se refere a algo que já foi citado antes. Mas o que já foi citado antes é um período complexo, com muitos verbos, vírgulas etc. Para entender melhor essa primeira frase, podemos olhar o diagrama abaixo:


O pronome dies se refere a tudo o que foi dito antes. Há três informações sobre o "Material" que compõe (zusammensetzt) o contéudo do sonho (Trauminhalt). A oração principal é a de baixo. As duas outras orações são uma explicação (ou melhor, uma informação adicional) desta principal (iniciadas por also). E tudo isso que foi dito já deve ser considerado (gelten) pelo menos (wenigstens) como um reconhecimento incontestável (unbestrittene Erkenntnis).

Tente fazer isso com seus textos da faculdade ou qualquer texto do seu interesse. Tente traduzir uma ou duas páginas por dia, como exercício. Com frases longas, veja onde uma coisa começa e termina. Procure palavras que indiquem para outras partes da oração.

E você tem mais dicas de como melhorar o seu alemão através da leitura? Compartilhe nos comentários.